Secretamente...
Escuta-me
mais um instante, mais um momento, pára, aqui, em mim, neste meu querer que te
chama, nestas minhas letras que o teu corpo percorrem, que o teu sorriso
almejam – assim pensava ele, no silêncio
do seu quarto, sentado numa cadeira de cor escarlate, bebendo um chá quente com
aroma a maça e canela.
A
caneta deslizava pelo papel, os raios de sol desciam pelos prédios e o quarto
deixava de ser iluminado pela luz do dia. Acendendo o candeeiro a óleo, que
tivera comprado numa feira de velharias, ele rabiscou o rosto dela em palavras
e versos de um sentimento distinto, de um sentimento crescido de forma tão
peculiar e ao mesmo tempo tão estranho. Sentia-a, sentia a presença do seu
corpo nos lençóis de linho com cheiro a vontade, com sonhos desenhados nos
pospontos que uniam todo aquele refúgio, todo aquele mar de projectos ardentes
de uma chama que aquece sem queimar.
Num
ápice levantou-se, foi até à varanda, ouvia-se ao perto o mar agitado de um anoitecer
de Outono, acendendo um cigarro ficou a olhar as estrelas e foi, nesse momento
a sós, que confessou ao luar o amor que transportara no peito, um amor ora
acreditado, ora refeito, um amor carnal, um amor espiritual. Tirando do seu
bolso uma folha amarrotada, buscou por entre as tralhas a sua máquina de escrever
e, num amarelado bilhete, escreveu;
Em
cada retrato do teu ser vivem as linhas que percorro, linhas tortas e direitas,
carregadas ou suaves. Na verdade procuro-te como se procura a felicidade,
vivo-te em cada inspiração que faço, em cada prosa que te escrevo. Narro-te nestes
contos vivos em sinais, em bilhetes ou em simples melodias que largo ao vento. Senti-te,
olhando o céu sei que estaremos sempre unidos, o teu céu será sempre igual ao
meu e, onde quer que estejas, a lua irá iluminar o teu rosto, desvendando o teu
sorriso, enchendo de brilho o teu olhar. Sou o homem que te procura e não se
casa de te esperar, sou cavaleiro sem espada e um errante que continua a
acreditar. Sonhos meus que se cruzam no teu seguir, oceanos de um desejar,
diferenças esbatidas pela forma de amar. Coração meu, pedaço de carne, pés que
percorrem e mãos que agarram, espero-te, desejo-te, gosto-te...
Deixando
que a noite fria caísse sobre o seu corpo, ali ficou, num silêncio tão seu, numa
confidência partilhada consigo mesmo, num monólogo de conversas cruzadas em que
se exprimem desejos de um homem em construção. Nunca nada foi em vão e muito
menos programado, no amor sente-se, cada fragmento, de uma forma intensa, como um
barco de grandes dimensões projectado de forma brusca de encontro o nosso
corpo, fazendo-nos acordar, adormecer, lutar ou então viver. Neste amor que não
conhece fronteiras, barreiras e até mesmo figuras, começa-se a amar de forma
simples mas, não é com a mesma facilidade, que compreendemos muitas das nossas
paixões.
Já
foi com a lua alta que saiu daquela varada, de uma cadeira de verga em que a humidade
se entranhava arrefecendo o seu corpo. Naquele momento ele sentiu-se
verdadeiramente vivo, vivo não só por fora, vivo em cada artéria do seu
coração, de um coração que nunca se esqueceu o que, para ele, era e é amar...
"o teu céu será sempre igual ao meu" :)
ResponderEliminarjá estava com saudades das tuas palavras
ResponderEliminaro bilhete amarelado... belissimas palavras nele, quem me dera receber um.
beijinhos*